sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Atrás da porta

Disse o Mar: meu tempo tem muitos silêncios e um grande e permanente ruído; um zumbido. Apito eterno que me faz lembrar e esquecer. É nos silêncios, quando esqueço o som que me acorda, que dedilho as cordas do vento que vem do Pântano, margeando a Ilha, sussurrando para as folhas a maciez da água; a rispidez da pedra; a mão que abana a falta de ar durante a brisa gelada; a ausência. É o vento quem traz notícias, o cheiro, a cor do quase final de tarde que, inusitado, arredio, expõe-se sem nome, sussurrado apenas, mesmo no meio da luz da Primavera. Poderia ser saudade, se algo pudesse descrever o que saudade é na verdade, senão um vazio cheio de nada, ardido, e um prato de onde, pelas bordas, escorre uma ausência que se sente.

Disse a Nuvem: as horas me perdem, perco-as sem ver após as curvas as curvas da Ilha, senão respingos de água depois de amassados contra a praia. Mas ainda há sol além do dia; resta um beijo que nunca será; uma carícia escondida atrás da porta; inúmeros sentimentos sob a cama, acomodados delicadamente junto aos medos.

Olharam-se atordoados. Feitos um do outro, nunca serão o mesmo.